segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Iesus Nazarenus Rex Iudaeorum (INRI): os pingos nos “is”, os pingos nos jotas.

Lá estão elas, pequenininhas e fixadas no alto de um crucifixo, as quatro letrinhas sagradas: INRI. São iniciais da expressão latina Iesus Nazarenus Rex Iudaeroum. Tradução para o nosso português: Jesus Nazareno Reis dos Judeus.

A dita expressão costumava ser falada e escrita pelo povo latino, como os soldados romanos, cuja linguagem carregava o rótulo social de estigmatizada por ser coloquial, popular. Havia também a sua variante linguística culta, a de prestígio social, assim lida e grafada: ieshva nazareno rex ivdaeorvm.

Chamo atenção dos leitores a este fato histórico para exemplificar a origem do pingo na letra “j” (jota: do latim iota). Recentemente chegaram-me discussões em torno da obrigatoriedade deste pingo na letra “j” minúscula (javali) e/ou maiúscula (Jaguaribe) em redações exigidas nas provas escritas de concursos, vestibulares e em outras situações.

Diante de tal debate, quero apresentar-lhes as seguintes ponderações sobre a necessidade ou não-necessidade do uso deste pingo no “j”:

1ª) Na língua latina, usava-se o “I” como na palavra Iesus. Séculos e séculos após, os falantes da língua portuguesa, que é uma língua derivada do Latim, foram aos poucos articulando o “I” para o “j” com a consequente preservação do pingo no “I”, fenômeno linguístico denominado consonantização. A dúvida reside se nós falantes contemporâneous devemos usar o pingo também quando o “j” (jota) estiver em sua forma maiúscula. Ora, percebemos que no universo de jornais, revistas, livros, textos contendo linguagem culta ou mesmo popular, não se utilizam o pingo no jota maiúsculo, mas sim no minúsculo.

Grafamos então todos os jotas minúsculos, assim: javali, jabá, jeito, jantar, jura, jiló.
Mas grafamos os jotas maiúsculos assim, sem o pingo: João, Juju, Jaguari.

2ª) Entretanto, há um contraditório nessa manutenção do pingo no “j” durante a passagem do idioma latim para o português (Iesus para Jesus), qual seja o simples fato de hoje falarmos e escrevermos língua portuguesa do Brasil e não lingua latina. Não escrevemos discipulus, mas sim discípulo; não escrevemos Iesus, mas sim Jesus.

3ª) O emprego ou não-emprego do pingo no “j” minúsculo ou maiúsculo não vai alterar o significado da palavra que contenha esta letra. Digo mais: não vai comprometer a clareza do sentido da palavra ou da frase. Portanto, será indiferente o uso de uma ou outra forma, ou seja, com ou sem pingo não afetará a semântica da coisa. Ao contrário da omissão do sinalizador de cedilha do “ç” que afetaria a compreensão de um vocábulo como “taça” caso se tenha a intenção de usar um vocábulo que signifique copo (ex.: Quero uma taça de vinho) em confronte com a palavra taca (do verbo tacar) como em “O jogador taca a bola de futebol para fora do campo”.

4ª) Não se tem conhecimento da existência de gramática alguma, manual de redação ou outra publicação congênere que oriente a escrever obrigatoriamente o “j” (jota) minúsculo acompanhado do pingo. Apenas notamos que esta letra vem registrada, com pingo, no alfabeto da língua portuguesa.

Finalmente, concluímos que uma banca examinadora de concurso ou vestibular não deve exigir o uso obrigatório do pingo no jota minúsculo, pois não existe regra pré-existente sobre tal obrigatoriedade de uso. Por outro lado, deduzimos também que é de uso mais frequente e tradicional o pingo no j, de maneira que seria prudente ao candidato que faz a questão de prova optar pela forma do “j” minúsculo com pingo.

E se existe uso facultativo de determinada grafia e/ou pronúncia de palavra, verbete, optemos pelo uso daquilo que é mais frequente e tradicional, a exemplo de acrobata em vez de acróbata; safári no lugar de safari ou jibóia com pingo no “j”.